No âmbito da 1ª Semana Nacional sobre Espécies Invasoras, a SPECO - Sociedade Portuguesa de Ecologia entrevistou Hélia e Elizabete Marchante, investigadoras na Escola Superior Agrária de Coimbra e no Centro De Ecologia Funcional, ligadas à organização deste evento e que, juntamente com a restante equipa, promovem e dinamizam a plataforma Invasoras.PT.
1. Como e por que razão surgiu a ideia de criar a Semana Nacional sobre Espécies Invasoras?
Hélia & Elizabete Marchante (H&EM): Surgiu da vontade de fazer chegar o tema das invasoras a todos os cidadãos. Apesar de a nossa equipa investir muito na sensibilização/ comunicação/ formação sobre este tema, temos noção que continua a ser desconhecido de grande parte dos cidadãos. A ideia é que a SNEI, ao reunir muitas actividades diferentes (em termos de grupos taxonómicos, tipo de actividade, etc.), promovidas por muitas entidades diferentes, em muitos locais do país (de Norte a Sul passando pelas ilhas), mas todas concentradas na mesma semana, possa aumentar um pouco a visibilidade do tema e, assim, também aumentar o grupo de cidadãos a quem chega a informação.
2. Perante a perda de biodiversidade que estamos a assistir, em que medida as espécies invasoras podem ser consideradas uma ameaça?
H&EM: As espécies invasoras são actualmente consideradas uma ameaça muito real e concreta: a nível global (IPBES 2019) são a 5ª principal causa de ameaça à biodiversidade. Em algumas ilhas chegam a ser a principal ameaça.
3. Poderão, de forma sucinta, explicar a razão da importância do conhecimento público desta problemática, do conhecimento destas espécies e de como as eliminar?
H&EM: De uma forma muito simples: cidadãos bem informados/ alerta para esta problemática podem dar contributos para resolver (ou pelo menos não agravar) as invasões biológicas, por exemplo, selecionando espécies nativas ou exóticas seguras para utilização; colaborando no controlo de espécies invasoras; não introduzindo novas espécies invasoras ou com potencial invasor, etc. Por outro lado, cidadãos que desconhecem o problema podem facilmente contribuir para o agravar, por exemplo, servindo de dispersor de sementes/ propágulos invasores agarrados à roupa ou aos sapatos; plantando espécies invasoras; libertando animais de estimação que se podem tornar invasores, etc.
4. Algumas das espécies, como as plantas, erva-das-pampas ou a lantana camara são usadas como espécies ornamentais, que facilmente se propagaram ou propagam. Como passar a mensagem que por vezes a escolha que fazemos para ornamentar o nosso jardim, não é a melhor para a saúde do nosso ecossistema urbano? E que fatores preventivos podemos tomar, enquanto cidadãos?
H&EM: Acredito que se conseguirmos fazer chegar a informação dos impactes, problemas que estas espécies causam (por exemplo, no caso da erva-das-pampas causa alergias e corta; e ameaça outras espécies, e promove prejuízos económicos associados às operações de remoção que se tornam mais dispendiosas do que se fossem espécies fáceis de remover), os cidadãos vão compreendendo - principalmente, se conseguirmos falar de impactes que estão próximos de si (i.e., lhes dizem qualquer coisa, não é algo distante).
Para prevenir podemos, por exemplo, não usar de todo espécies invasoras (o que é de resto ilegal, podem consultar a lista no Decreto-Lei nº 92/2019) e quando queremos utilizar outras espécies exóticas devemos pesquisar primeiro se têm potencial invasor. Ou podemos ir por outro caminho, e utilizar apenas espécies nativas (com os devidos cuidados que isso também implica). Outra questão importante na prevenção é "passar palavra" sobre esta problemática - para que outros possam também evitar o uso de espécies invasoras. Para isso há que procurar informar-se sobre as espécies invasoras e seus impactes, e, no fundo, interessar-se mais pela conservação da natureza e das espécies e ecossistemas nativos porque em última análise é em prol desses que precisamos diminuir as espécies invasoras.
5. A participação cidadã é fundamental para o conhecimento e controlo de focos de invasão. Como tem sido a participação pública/ ciência cidadã ao longo deste projecto?
H&EM: A plataforma de ciência-cidadã INVASORAS.PT teve início em 2013 e inclui um mapa de avistamentos de plantas invasoras que é construído aos poucos pelos cidadãos que se registam; mais recentemente, incluímos os Desafios INVASORAS.PT em que os cidadãos também podem contribuir de várias formas. Tem-nos surpreendido pela positiva, pelo nível de adesão que temos tido. Ainda assim, sabemos que precisamos de muitos mais cidadãos-cientistas! E "sofremos" do mesmo problema que a maior parte deste tipo de plataformas de ciência-cidadã: muitos inscritos, muitos dos quais não fazem mais do que se inscrever; dos restantes muitos fazem 1 ou 2 registos (avistamentos) e uma pequena percentagem faz muitos registos. Há até trabalhos que remetem para a "regra" do 90:9:1; felizmente estamos melhor: da última vez que avaliamos por cada 100 tínhamos 66 inactivos, 26 com contributos esporádicos e 8 com contributos regulares.
6. Como é que os cidadãos, em geral, podem adquirir conhecimentos sobre como actuarem como parte ativa desta “luta”? Isto é, adquirir conhecimentos de quais são as espécies invasoras, como as identificar e eliminar, quem alertar, assim como das atitudes preventivas a tomar, entre outras.
H&EM: O objectivo da plataforma INVASORAS.PT, para além da componente chave de ciência-cidadã, procurar disponibilizar informação sobre todos esses aspectos, não só através da página web, mas com muitas actividades que organizamos e participamos por todo o país, desde palestras, cursos, formações, acções de voluntariado no terreno, etc. Em termos da página web ainda precisamos melhorar a forma de tornar a informação mais útil e facilmente acessível, por exemplo em termos de controlo das espécies, mas é um processo que está em curso :)
Mais informações em: https://www.invasoras.pt/pt/semana_nacional_especies_invasoras_2020
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