No dia 21 de Março, comemora-se, anualmente, o Dia Internacional das Florestas e, em Portugal, o Dia da Árvore.
Neste dia, a SPECO lança a proposta: Plante o conhecimento de uma árvore lá de fora, cá dentro.
Esta data foi instituída pelas Nações Unidas em 2012 para sensibilizar e consciencializar para a importância da floresta. Em cada ano as organizações são convidadas a lançar iniciativas que promovam local e regionalmente este dia.
Em 2020, iniciando a Década do Restauro Ecológico, este dia tem como tema as Florestas e a Biodiversidade. As florestas albergam cerca de 80% da vida terrestre, desde insectos a mamíferos, peixes a anfíbios, répteis a aves. São essenciais à vida na Terra, fornecendo ao Homem alimento e preservando a biodiversidade que encerra. Pelo seu papel no ciclo de nutrientes, da água e do carbono, impedem a erosão dos solos, funcionam como filtros da poluição atmosférica e das águas, são sorvedouros de gases com efeito de estufa e regulam o clima. As florestas são, pois, peças chave no combate à poluição, na protecção de ecossistemas e de muitas actividades humanas. Os seus benefícios abrangem a ecologia, a economia, a sociedade e a saúde.
O termo floresta é muito usado na Europa do norte e está muito associado às florestas temperadas mistura de carvalhos, bordos, faias, nogueiras, árvores de folhagem caduca. No Mediterrâneo sempre imperaram as matas, os matos e matagais, com árvores e arbustos, com uma estrutura aberta e multifuncional. Actualmente, o termo floresta generalizou-se e está muito associado a uma área de exploração económica, maioritariamente madeira. Foi o poder económico que levou a esta alteração ecológica vilipendiando o papel da árvore e, em particular, as suas interacções entre os diferentes organismos e o ambiente que as rodeia. Em Portugal as florestas actuais são, maioritariamente, monoculturas sem diversidade e com muito poucas interacções alterando o equilíbrio do ecossistema e aumentando a sua vulnerabilidade a pragas e incêndios. Sendo ecossistemas cada vez mais humanizados, as florestas são diariamente ameaçadas devido à desflorestação, incêndios, levando à destruição anual de milhares de hectares e, com eles, da biodiversidade que delas depende.
Neste dia, uma das actividades mais comuns era a organização de plantação de árvores. Diversas organizações não governamentais, empresas, escolas, universidades promoviam actividades de combate à desflorestação, por meio da florestação e reflorestação. Este ano de 2020, devido às medidas tomadas para o combate à propagação do COVID-19, muitas acções de plantação de árvores foram canceladas. No entanto, não será esta a razão pela qual em 2020, este dia não é celebrado.
A SPECO vem trazer uma alternativa que se pode fazer sem sair de casa, dar a conhecer algumas curiosidades sobre árvores. Colocando-vos o desafio: Divulguem o vosso conhecimento propondo uma história sobre uma árvore com um máximo de 5000 caracteres. Poderão enviar o vosso texto para info@speco.pt, que de seguida será colocado neste artigo, nunca esquecendo o vosso direito como autores. E assim se divulga o conhecimento científico.
"Plante o conhecimento de uma árvore lá de fora, cá dentro."
As árvores
Venham agora conhecer algumas das árvores que tornam o nosso planeta mais rico e diverso.
Os Gigantes da Natureza: as Sequóias
Se se pensar em todos os organismos vivos, o Homem pode ser considerado um pigmeu em comparação aos maiores gigantes que se conhecem: as sequóias. Estas árvores, do grupo das coníferas e da família dos ciprestes dos pântanos (Taxodiaceae), são gimnospérmicas ou plantas com sementes nuas, que tiveram o seu apogeu no período terciário, há mais de 180 milhões de anos. As sequóias gigantes (Sequoiadendron giganteum), podem atingir 112 m de altura, mais 20 m do que a Estátua da Liberdade ou equivalente a um prédio de 30 andares. No reino animal, a baleia azul fica aquém deste tamanho, atingindo apenas 35 m de comprimento. Como termo de comparação, esta árvore gigante pode equivaler, em peso, a 15 baleias azuis ou mesmo a 10 locomotivas de combóio.
Na Califórnia, no Parque Nacional de Redwood, onde foi encontrada a árvore mais alta, são vulgares as sequóias atingirem alturas com mais de 90 m. Os troncos chegam a alcançar 13 m de perímetro e possuem cerca 15 a 20 cm de espessura de casca, autêntica protecção para insectos e fogos. Esta protecção natural, aliada a uma grande resistência a doenças, faz com que possam viver mais de 2,000 anos, crescendo a um ritmo de 25 cm por ano.
As suas folhas são finas, simples, aciculares e mantém-se nas árvores durante mais de 2 anos. As sequóias californianas podem ser igualadas em tamanho aos eucaliptos australianos (Eucalyptus regnans), que são plantas com flôr (do grupo das angiospérmicas). Há pelo menos registos do séc XIX de que foi medida uma árvore com 130 m embora actualmente estas árvores atinjam apenas entre 80 a 90 m de altura.
Independentemente da espécie, como é que uma árvore pode atingir alturas daquela magnitude? Como é que, do ponto de vista mecânico, a água pode circular no tronco e ir desde as raízes até ao topo? Até há bem pouco tempo apenas se constatava a altura, mas nunca ninguém compreendeu ou testou a eficiência mecânica deste sistema vivo. Há alguns anos, um grupo de investigadores californianos identificou quatro factores limitantes do crescimento em altura das árvores
A água sobe devido à transpiração, processo pelo qual a água que chega aos estomas, presentes na superfície das folhas, se evapora para a atmosfera. O fluxo de transpiração é o responsável pela subida da água, através de vasos condutores, desde a raiz até às folhas, no topo. Este movimento anti-gravitacional da água, só é possível devido às elevadas forças de tensão geradas nos vasos condutores do xilema. A partir dum determinado ponto esta força quebra-se, geram-se embolismos com formação de bolsas de ar e interrompe-se o fluxo de água. O embolismo é um processo normal presente em todas as plantas. Quando se dá embolismo os raminhos, ramos ou troncos morrem, por lhes ter sido cortado o fluxo de água, fundamental para a divisão e metabolismo celular. O processo é semelhante ao que se passa no corpo humano. No entanto, no caso das plantas, como o seu crescimento é modular, o facto de um raminho, ramo ou tronco sofrer de embolia, não significa que a árvore páre o crescimento. Ele continua noutra direcção sendo, por isso, um mecanismo de sobrevivência distinto do presente nos animais e no Homem.
Durante o estudo, os investigadores encontraram tensões máximas a 100 m de altura, perto do ponto a partir do qual se gera o embolismo. Consideraram que este é dos primeiros controlos da altura.
Um dos efeitos da redução do fluxo de água é o tamanho celular. As células das folhas no topo da canópia são reduzidas, de paredes espessas. A 110 m de altura as folhas das sequóias são muito pequenas e densas, porque o crescimento é reduzido e limitado. Esta foi considerada a segunda limitação ao crescimento em altura.
Sendo as folhas reduzidas e densas, isso significa que o investimento em estruturas de suporte é maior do que a actividade de fixação de carbono das folhas o que diminui a eficiência fotossintética. Esta diminuição de eficiência impõe uma terceira limitação ao crescimento.
Mantendo a coluna de água no xilema acima do ponto de embolismo, afecta as trocas gasosas que se dão ao nível da folha. Através dos estomas as folhas absorvem anidrido carbónico (CO2) e libertam oxigénio, durante o processo de fotossíntese. Os investigadores californianos verificaram que a difusão de CO2 no interior das folhas era baixa, limitando a própria actividade fotossintética. Esta foi considerada a quarta limitação.
Este estudo permitiu prever o tamanho, em altura, que as árvores podem atingir, que não será mais do que 130 m. Se isto é certo, quer dizer que as árvores mais altas (112 m), já com mais de 2,000 anos, podem ainda crescer.
Como curiosidade, nestas árvores, a água demora cerca de 24 dias a ser levada das raízes para o topo e quando há um período de seca, as folhas podem permanecer vivas fechando os estomas, o que as impede de transpirar mas também limita a fotossíntese. Nestas condições, as árvores não morrem porque o seu tronco é ao mesmo tempo um armazenador de água. Este capacidade armazenadora corresponde apenas a 2-3% de todo o volume do tronco mas, nas árvores altas, é um reservatório de água considerável que pode fornecer cerca de 18% da água necessária para a actividade fotossintética.
Durante o crescimento a árvore é um verdadeiro consumidor de água. Por exemplo, uma sequóia com 45 m de altura pode gastar cerca de 600 kg de água por dia, valor que aumenta significativamente com o crescimento em altura e largura.
Como é que nestas condições as árvores podem sobreviver em climas com estações secas de 3 a 4 meses ? E numa situação de maior secura quanto tempo poderão resistir?
Maria Amélia Martins-Loução
Um Recurso do Mediterrâneo: a Alfarrobeira
Numa altura em que a perda de biodiversidade é uma realidade e o interesse agronómico por novas espécies é estimulado pela FAO e pelo IPGRI, justifica-se a promoção e conservação de espécies mediterrânicas autóctones (nativas) adaptadas a condições de mudança climática global e especialmente aptas a conservarem o solo. A alfarrobeira é uma destas espécies. Tem a vantagem de se distribuir por toda a bacia do Mediterrâneo, de se adaptar ao clima árido a semi-árido, a solos de reduzida qualidade, não exigir grandes cuidados na sua manutenção, e manter a sua produção para além dos 150 anos. A alfarrobeira é uma árvore de grande porte que necessita de menos água, menos cuidados intensivos, garante preços sustentáveis e oferece grande diversidade de produtos derivados economicamente rentáveis.
A alfarrobeira está presente no Mediterrâneo oriental ainda antes do início da agricultura. Esta informação é baseada em achados arqueo-botânicos de há mais de 43 000 anos (AC) encontrados na região que é actualmente Israel. Apesar de ainda não ser claro o seu centro de origem, alguns autores consideram que a alfarrobeira não é originária do Mediterrâneo mas antes de uma de duas regiões: ou de Oman, a sudeste da Península Arábica, ou junto ao corno africano, a norte da Somália. Esta hipótese é suportada pelo facto de ter sido descoberta, nesta região, a outra espécie do género Ceratonia - C. oreothauma. A alfarrobeira é considerada uma relíquia de uma flora indo-malaica de origem xerotropical, juntamente com a oliveira, loureiro, mirtus e palmeira anã.
Frequentemente, em muitas zonas do Mediterrâneo, as cultivares domesticadas e selvagens crescem lado a lado, entrecruzando-se livremente. Isto aumenta e potencia a variabilidade genética, ajudada pela pressão de selecção induzida pelo homem. A selecção e expansão feita pelo Homem Mediterrânico e a adaptação ecológica às condições ambientais constituíram as maiores forças evolutivas desta espécie. Por exemplo, as condições mais áridas, mais do que as sub-húmidas a semi-áridas induzem maior variabilidade dentro da mesma cultivar, nalguns casos maior do que entre populações.
Factores determinantes na expansão e adaptação da alfarrobeira são a geada e o nevoeiro que podem levar a infecções de Oidium ceratoniae Ames, tanto em folhas como em frutos.
No Mediterrâneo, a água é um dos factores mais limitantes ao crescimento e produtividade das espécies vegetais. Este aspecto está directamente relacionado com as condições climáticas características desta região e da falta de capacidade de reserva e de retenção hídrica dos solos. A grande maioria das espécies mediterrânicas de folhagem persistente, como é o caso da alfarrobeira, apresenta elevado grau de esclerofilia, i.e. folhas duras e coriáceas, que funciona como mecanismo de controlo da perda de água. Para além disso, a alfarrobeira adquiriu a capacidade de extrair muito rapidamente a água do solo de forma a compensar as perdas para a atmosfera, o que é possível devido ao desenvolvimento em profundidade do sistema radicular e a alterações rápidas do potencial hídrico. Sendo uma espécie capaz de sobreviver e produzir apenas com 250 mm de pluviosidade, pode dizer-se que esta espécie apresenta mecanismos específicos de adaptação ao stress hídrico.
Durante séculos a alfarrobeira tem contribuído para a economia da bacia do Mediterrâneo, fundamentalmente como alimento para o gado. Os egípcios também produziam vinho com os seus frutos. A polpa dos frutos servia para tingir couros e, com as sementes, confeccionavam-se rosários ou colares decorativos.
Nas últimas décadas o número de publicações sobre a alfarrobeira tem sido maioritariamente ligado às suas aplicações tecnológicas e biotecnológicas (54%), com aplicação directa à indústria farmacêutica e alimentar e produção de bioetanol. De entre estas publicações tecnológicas, 35% correspondem a registos de patentes. A avaliação bibliográfica mostra o interesse que esta cultura continua a despertar a nível global tanto mais que algumas das publicações ou desenvolvimentos industriais foram desenvolvidos por investigadores fora da bacia do Mediterrâneo, na China, Japão ou mesmo nos Estados Unidos, ligados a unidades de investigação ou empresas multinacionais. O valor económico da cultura passa assim por um incremento na valorização do fruto como um todo e na diversificação das suas utilizações.
O movimento comercial da alfarroba inicia-se imediatamente a seguir à colheita. A quase totalidade da produção portuguesa destina-se, desde sempre, ao mercado externo, constituindo assim um importante contributo na obtenção de divisas e na valorização económica da região do Algarve.
Portugal exporta alfarroba sob a forma de triturado grosso e farinha de polpa, farinha de endosperma e de germe triturado (ou em farinha). Todo o fruto se aproveita, embora a sua excelência esteja ainda ligada à semente (10% da vagem), donde é extraída a goma (LBG-E410), constituída por hidratos de carbono complexos (galactomananos), utilizada como espessante, estabilizante, emulsionante, com múltiplas utilizações na indústria alimentar, farmacêutica, têxtil e cosmética. O valor económico da goma é devido, particularmente, ao seu uso na indústria alimentar que se justifica pelas suas características não tóxicas e de elevado grau de pureza. Da semente retira-se cerca de 40% de hidrocolóides e 20% de gérmen, farinha alimentar altamente proteica, rica em vitamina B1 e B2, usada em comida de bebés. A farinha da polpa tem sido cada vez mais utilizada como substituto de chocolate, não só para bolos como para pão, como alternativa dietética.
Tendo em conta as alterações climáticas que se fazem sentir na Península Ibérica, a sustentabilidade dos agro-ecossistemas de alfarrobeira cultivadas em regime de sequeiro requer novas perspectivas de exploração. Vários novos compostos foram identificados na polpa de alfarroba, e alguns deles estão relacionados com as características do solo, mas devia ser implementado um mercado exigente e regular para esses produtos. Por outro lado, o potencial de sequestro de carbono das árvores deve ser claramente assumido como uma nova fonte de renda. Esta poderia ser uma nova forma de rentabilizar, a longo prazo esta cultura tradicional do sul da Europa.
Maria Amélia Martins-Loução
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Textos de Inês Reis dos Santos e Maria Amélia Martins-Loução.
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